segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Razões para não extraditar Battisti.


Razões para não extraditar Battisti.

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, por cinco votos a quatro, pela extradição de Cesare Battisti. Ao mesmo tempo, os ministros, pelo mesmo placar, deixaram a decisão final sobre o destino de Battisti para ser tomada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Cesare Battisti foi condenado na Itália pela suposta participação em ações armadas que resultaram na morte de quatro pessoas. As ações foram comandadas pela organização de extrema-esquerda PAC (Proletários Unidos pelo Comunismo), da qual Battisti era militante.

Ele alega inocência. Diz que não teve participação nas mortes das quais é acusado. E já restou provado que sua condenação foi fruto de um julgamento altamente questionável, no qual seu direito de defesa foi limitado. Preso em 1979, inicialmente foi acusado apenas de participação em ações subversivas, nenhuma delas envolvendo violência. Só em 1988 é que surge a condenação pelos homicídios, a partir da delação premiada de um ex-militante que havia sido acusado pelos homicídios, mas transferiu a culpa para Battisti, sendo assim beneficiado com uma pena menor. Battisti, que estava foragido, foi então julgado à revelia e condenado à prisão perpétua.

Não cabe aqui julgar a culpa ou a inocência de Battisti, muito menos enaltecê-lo como militante de esquerda. Uma parte importante da própria esquerda italiana não nutre nenhuma simpatia por ele e recusou-se a participar dos apelos para que ele não fosse extraditado.

O fato que deve ser levado em conta para defender o refúgio ao escritor é que não há motivos políticos, nem ideológicos, para extraditar Battisti. Pelo contrário, sobram motivos para manter o refúgio e deixá-lo no Brasil.

A começar pelo motivo humanitário: na Itália, Battisti estaria condenado a morrer na cadeia. Como bem lembrou seu advogado, ativistas brasileiros, acusados ou mesmo condenados pelos mesmos atos, foram anistiados. Assim como seus torturadores. "Por que o Brasil deveria abandonar sua tradição humanitária para fazer uma ponta nesse filme e como carrasco? Devemos fazer parte de uma missão de paz. Não somos vingadores mascarados.

Há também muitos motivos políticos para não extraditar Batisti. A tradição da política externa brasileira é de concessão de refúgio a todos aqueles que pedem o benefício ao Brasil por sofrerem perseguição política em seu país. O Brasil já refugiou até figuras nefastas como o ex-ditador paraguaio Alfredo Stroessner, porque não refugiar um ex-ativista de esquerda? Uma segunda razão para não extraditar Battisti é que isso desautorizaria o ministro da Justiça, Tarso Genro, que concedeu o refúgio ao ex-ativista. Terceiro motivo: a extradição legitimaria, para júbilo de Gilmar Mendes, o equívoco do STF que exorbitou de suas funções ao julgar a legalidade do refúgio, que é uma prerrogativa exclusiva do poder executivo e não deveria ter sido alvo de deliberação do Supremo. Por fim, extraditar o ex-ativista seria uma vitória da direita conservadora, tanta a italiana quanto a brasileira, que encaram a extradição de Battisti como um trunfo na luta ideológica contra a esquerda.

Guardadas todas as devidas diferenças históricas e pessoais, a eventual extradição de Battisti inevitavelmente seria comparada com a atitude que o governo Vargas tomou ao entregar para os nazistas a dirigente comunista Olga Benário. O enredo, os pesonagens e as circunstâncias destas duas histórias são completamente diferentes, mas é difícil não estabelecer este paralelo. A extradição de Battisti seria como entregar um troféu ao governo neofascisa de Silvio Berlusconi, o mesmo governo que nos ofendeu, subestimou e tentou humilhar as instituições brasileiras.
Lula não precisa desta mancha em sua biografia.

Antes de se refugiar no Brasil, Battisti passou dez anos no México e 14 anos na França. Constituiu família, teve filhas, sobreviveu como zelador e como escritor de pensamento progressista. Neste período, não se envolveu em nenhuma atividade que pudesse representar qualquer ameaça para a sociedade.

No último dia de seu mandato o presidente Lula decidiu negar a extradição de Battisti.

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