Saudações.
Para Laurindo Leal Filho, sociólogo, jornalista e professor da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (USP) é "praticamente impossível a isenção total” e, a melhor solução para esse dilema é que os meios de comunicação assumam abertamente suas posições e quem apoiam para que o público não seja enganado.
Laurindo Leal Filho: Não. A mídia, de uma maneira geral, não só no Brasil, mas em todos os países mais desenvolvidos, sempre assume uma posição, principalmente, nos pleitos majoritários, como é o caso de uma eleição para presidente da República. É praticamente impossível a isenção total. Os meios de comunicação, na maioria dos países, não têm nenhuma preocupação com isso. A diferença entre quase todos os meios de comunicação do Brasil e os do exterior é que, no exterior, eles assumem, publicamente, o candidato ou o partido que estão apoiando. Isso não quer dizer que vão fazer uma cobertura distorcida do pleito. Eles não escondem que têm preferência por esse ou aquele candidato. Isso, na França, na Inglaterra, é muito comum. Os jornais acompanham uma determinada tendência política, e o leitor sabe disso.Estabelece-se uma relação mais franca com o leitor…Infelizmente, no Brasil, alguns jornais ou a maioria deles anuncia que é independente, equidistante dos candidatos, mas, na verdade, acabam exercendo isso, que é muito ruim. Acabam escondendo do leitor a sua posição política. Acho que duas honrosas exceções no Brasil, na mídia impressa, são o Jornal O Estado de S.Paulo – que, nas duas últimas eleições, tem apoiado os candidatos do PSDB explicitamente – e a revista Carta Capital, que tem apoiado os candidatos do PT.
O senhor acredita que esse deveria ser o caminho adotado pela mídia impressa de maneira geral?
É o caminho mais honesto. Do contrário, você acaba enganando o leitor com a suposta imparcialidade que, na verdade, não existe. Basta ver o que os jornais já estão fazendo hoje nesta eleição, com posições claramente a favor do candidato da oposição. Os três grandes jornais brasileiros, Globo, Folha (de São Paulo) e Estado (de São Paulo) estão nitidamente se colocando a favor do candidato da oposição. E as revistas semanais, com exceção da Carta Capital, também. Especialmente, a Veja. Claramente, estão fazendo uma cobertura da cena política brasileira muito favorável à oposição.
Para o senhor, isso torna a disputa desleal?
Contribui. No Brasil, é pior ainda, porque os jornais impressos têm uma abrangência de cobertura relativamente pequena em relação à população, mas eles acabam pautando o rádio e a televisão. Estes, sim, atingem, praticamente, toda a população brasileira. Acompanham essa tendência não só por serem pautados nas suas linhas editoriais, nas suas coberturas, pelos grandes jornais, mas por também assumirem as candidaturas da oposição. Estou falando das grandes redes, o que é pior, porque se trata de uma ação ilegal. A televisão e o rádio são concessões públicas, diferente da mídia impressa, que são empresas particulares. São concessões públicas que estão usando o espaço público para interesses privados, que são os interesses políticos em relação a determinados candidatos. Então, eu acho que, para responder claramente, há uma distorção do processo eleitoral brasileiro no que diz respeito à cobertura da imprensa. Jornais impressos e revistas deveriam claramente divulgar para o leitor qual é a sua posição, e o rádio e a televisão deveriam se abster de fazer esse tipo de opção. Deveriam buscar o máximo possível a insenção, coisa que não fazem.
Na sua opinião, a imprensa tem o poder de eleger um candidato?
Não tem poder absoluto, porque se defronta com outras variáveis, mas contribui. Em outros momentos, a imprensa já teve mais força. Hoje, no caso específico das últimas eleições, está provado que a ação política do governo tem superado o jogo eleitoral da imprensa, mas não de uma forma absoluta.
Quais seriam essas variáveis?
Por exemplo, ações do governo que atingem diretamente o cidadão e melhoram sua condição de vida.
O Bolsa Família (programa de transferência de renda do governo federal), por exemplo?
Bolsa Família, projetos urbanos de habitação, de transporte. O Bolsa Família talvez seja o principal. Eles atingem de forma tão direta o cidadão que, por mais que a imprensa tome posição contrária, não consegue mudar a tendência de voto. Agora, não que isso seja absoluto. Nas eleições de 2006, a ação da imprensa foi decisiva para levar o candidato Geraldo Alckmin para o segundo turno. No final do primeiro turno, quando se previa uma vitória de Lula, a ação concentrada dos meios de comunicação a favor do candidato Geraldo Alckmin mudou o panorama. Não determinou a vitória dele, mas o levou ao segundo turno. A história do dossiê, que supostamente o PT teria comprado, colocada nas primeiras páginas dos jornais. Mas não foi só. Foi colocada no Jornal Nacional. Em outros momentos mais antigos, como no famoso debate Lula x Collor, foi decisiva a ação da televisão, editando o debate na véspera da eleição, mostrando que um dos candidatos tinha melhores condições e qualidade do que o outro. A ordem da Globo foi editar o debate com todos os momentos ruins de Lula e os minutos bons do Collor. Aquilo foi decisivo. Acho que a imprensa não define 100% um pleito, mas ela influi bastante.
O senhor acha que o eleitor brasileiro está preparado para fazer uma leitura crítica disso tudo?
Infelizmente, não. Temos no Brasil um processo de concentração da mídia que impede ao leitor, ao telespectador, ao ouvinte estabelecer comparações, alternativas. Temos uma mídia praticamente homogênea. Então, isso dificulta muito o que chamamos de leitura crítica da comunicação. Há a possibilidade de estabelecer essa crítica de que você está falando ou nos bancos escolares, o que não existe, ou então através de outro leque de opções de meios de comunicação, que deem a possibilidade de você perceber que um trata a política de um jeito e outro, de outro jeito. Aí, você pode fazer escolha crítica. No Brasil, não existe isso. Há uma situação quase que homogênea dos veículos, então, o telespectador, o leitor, o ouvinte têm dificuldade para fazer a crítica.
Isso, de certa forma, não compromete o processo democrático?
Sem dúvida. Tenho convicção de que, enquanto não tivermos uma redefinição do quadro de comunicação no Brasil, uma legislação, por exemplo, no caso do rádio e da TV, que estabeleça critérios mais rígidos, não para censurar, mas para aumentar a diversidade. No caso dos meios impressos, que se tenha mais atores nesse processo, jornais de outras tendências, enquanto não tivermos isso, nós não teremos completado o processo democrático. A democracia continuará meio capenga.
Para o senhor, a internet pode ser um instrumento nesse processo, uma vez que ela abre espaço para o debate?
Ela já é uma alternativa. Só que é muito restrita no Brasil. Às vezes, as pessoas acham, porque é na classe média onde os formadores de opinião circulam, que toda a população está sendo beneficiada pela internet. A internet só atinge, hoje, 18% da população brasileira. É uma parcela muito pequena. Ainda vai demorar um bom tempo para a democratização dela, 18% é o acesso domiciliar à internet, e não são 100% que têm acesso à banda larga. Acho que, no Brasil, a internet é um instrumento de democratização, mas ainda limitado a uma parcela pequena da sociedade.
Utopicamente os meios de comunicação deveriam ser isentos e imparciais.
Deveriam - mas em nenhuma parte do mundo é assim.
Pior que isso, no Brasil ainda encobre-se essa verdade sob o manto de hipocrisia e dos interesses econômicos.
Pobre do povo incauto que assiste à tudo sem se ater à esses detalhes..
Para Laurindo Leal Filho, sociólogo, jornalista e professor da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (USP) é "praticamente impossível a isenção total” e, a melhor solução para esse dilema é que os meios de comunicação assumam abertamente suas posições e quem apoiam para que o público não seja enganado.
Abaixo, reproduzo a entrevista do professor Laurindo Lalo Leal Filho concecida à jornalista Ana Cláudia Barros, do Terra Magazine. Nela o professor fala da relação incestuosa entre os poderes econômico e político, as elites e os meios de comunicação, o comprometimento do processo eleitora e da Internet como nova frente de informação livre.
Terra Magazine: Como o senhor avalia a atual cobertura eleitoral feita pela mídia? Na sua opinião, os candidatos são retratados com equilíbrio?Laurindo Leal Filho: Não. A mídia, de uma maneira geral, não só no Brasil, mas em todos os países mais desenvolvidos, sempre assume uma posição, principalmente, nos pleitos majoritários, como é o caso de uma eleição para presidente da República. É praticamente impossível a isenção total. Os meios de comunicação, na maioria dos países, não têm nenhuma preocupação com isso. A diferença entre quase todos os meios de comunicação do Brasil e os do exterior é que, no exterior, eles assumem, publicamente, o candidato ou o partido que estão apoiando. Isso não quer dizer que vão fazer uma cobertura distorcida do pleito. Eles não escondem que têm preferência por esse ou aquele candidato. Isso, na França, na Inglaterra, é muito comum. Os jornais acompanham uma determinada tendência política, e o leitor sabe disso.Estabelece-se uma relação mais franca com o leitor…Infelizmente, no Brasil, alguns jornais ou a maioria deles anuncia que é independente, equidistante dos candidatos, mas, na verdade, acabam exercendo isso, que é muito ruim. Acabam escondendo do leitor a sua posição política. Acho que duas honrosas exceções no Brasil, na mídia impressa, são o Jornal O Estado de S.Paulo – que, nas duas últimas eleições, tem apoiado os candidatos do PSDB explicitamente – e a revista Carta Capital, que tem apoiado os candidatos do PT.
O senhor acredita que esse deveria ser o caminho adotado pela mídia impressa de maneira geral?
É o caminho mais honesto. Do contrário, você acaba enganando o leitor com a suposta imparcialidade que, na verdade, não existe. Basta ver o que os jornais já estão fazendo hoje nesta eleição, com posições claramente a favor do candidato da oposição. Os três grandes jornais brasileiros, Globo, Folha (de São Paulo) e Estado (de São Paulo) estão nitidamente se colocando a favor do candidato da oposição. E as revistas semanais, com exceção da Carta Capital, também. Especialmente, a Veja. Claramente, estão fazendo uma cobertura da cena política brasileira muito favorável à oposição.
Para o senhor, isso torna a disputa desleal?
Contribui. No Brasil, é pior ainda, porque os jornais impressos têm uma abrangência de cobertura relativamente pequena em relação à população, mas eles acabam pautando o rádio e a televisão. Estes, sim, atingem, praticamente, toda a população brasileira. Acompanham essa tendência não só por serem pautados nas suas linhas editoriais, nas suas coberturas, pelos grandes jornais, mas por também assumirem as candidaturas da oposição. Estou falando das grandes redes, o que é pior, porque se trata de uma ação ilegal. A televisão e o rádio são concessões públicas, diferente da mídia impressa, que são empresas particulares. São concessões públicas que estão usando o espaço público para interesses privados, que são os interesses políticos em relação a determinados candidatos. Então, eu acho que, para responder claramente, há uma distorção do processo eleitoral brasileiro no que diz respeito à cobertura da imprensa. Jornais impressos e revistas deveriam claramente divulgar para o leitor qual é a sua posição, e o rádio e a televisão deveriam se abster de fazer esse tipo de opção. Deveriam buscar o máximo possível a insenção, coisa que não fazem.
Na sua opinião, a imprensa tem o poder de eleger um candidato?
Não tem poder absoluto, porque se defronta com outras variáveis, mas contribui. Em outros momentos, a imprensa já teve mais força. Hoje, no caso específico das últimas eleições, está provado que a ação política do governo tem superado o jogo eleitoral da imprensa, mas não de uma forma absoluta.
Quais seriam essas variáveis?
Por exemplo, ações do governo que atingem diretamente o cidadão e melhoram sua condição de vida.
O Bolsa Família (programa de transferência de renda do governo federal), por exemplo?
Bolsa Família, projetos urbanos de habitação, de transporte. O Bolsa Família talvez seja o principal. Eles atingem de forma tão direta o cidadão que, por mais que a imprensa tome posição contrária, não consegue mudar a tendência de voto. Agora, não que isso seja absoluto. Nas eleições de 2006, a ação da imprensa foi decisiva para levar o candidato Geraldo Alckmin para o segundo turno. No final do primeiro turno, quando se previa uma vitória de Lula, a ação concentrada dos meios de comunicação a favor do candidato Geraldo Alckmin mudou o panorama. Não determinou a vitória dele, mas o levou ao segundo turno. A história do dossiê, que supostamente o PT teria comprado, colocada nas primeiras páginas dos jornais. Mas não foi só. Foi colocada no Jornal Nacional. Em outros momentos mais antigos, como no famoso debate Lula x Collor, foi decisiva a ação da televisão, editando o debate na véspera da eleição, mostrando que um dos candidatos tinha melhores condições e qualidade do que o outro. A ordem da Globo foi editar o debate com todos os momentos ruins de Lula e os minutos bons do Collor. Aquilo foi decisivo. Acho que a imprensa não define 100% um pleito, mas ela influi bastante.
O senhor acha que o eleitor brasileiro está preparado para fazer uma leitura crítica disso tudo?
Infelizmente, não. Temos no Brasil um processo de concentração da mídia que impede ao leitor, ao telespectador, ao ouvinte estabelecer comparações, alternativas. Temos uma mídia praticamente homogênea. Então, isso dificulta muito o que chamamos de leitura crítica da comunicação. Há a possibilidade de estabelecer essa crítica de que você está falando ou nos bancos escolares, o que não existe, ou então através de outro leque de opções de meios de comunicação, que deem a possibilidade de você perceber que um trata a política de um jeito e outro, de outro jeito. Aí, você pode fazer escolha crítica. No Brasil, não existe isso. Há uma situação quase que homogênea dos veículos, então, o telespectador, o leitor, o ouvinte têm dificuldade para fazer a crítica.
Isso, de certa forma, não compromete o processo democrático?
Sem dúvida. Tenho convicção de que, enquanto não tivermos uma redefinição do quadro de comunicação no Brasil, uma legislação, por exemplo, no caso do rádio e da TV, que estabeleça critérios mais rígidos, não para censurar, mas para aumentar a diversidade. No caso dos meios impressos, que se tenha mais atores nesse processo, jornais de outras tendências, enquanto não tivermos isso, nós não teremos completado o processo democrático. A democracia continuará meio capenga.
Para o senhor, a internet pode ser um instrumento nesse processo, uma vez que ela abre espaço para o debate?
Ela já é uma alternativa. Só que é muito restrita no Brasil. Às vezes, as pessoas acham, porque é na classe média onde os formadores de opinião circulam, que toda a população está sendo beneficiada pela internet. A internet só atinge, hoje, 18% da população brasileira. É uma parcela muito pequena. Ainda vai demorar um bom tempo para a democratização dela, 18% é o acesso domiciliar à internet, e não são 100% que têm acesso à banda larga. Acho que, no Brasil, a internet é um instrumento de democratização, mas ainda limitado a uma parcela pequena da sociedade.
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